sábado, 16 de dezembro de 2017


INVERNO, RENASCER DAS TREVAS

Chegamos ao Solstício de Capricórnio no próximo dia 21 de Dezembro, efeméride que marca o início do Inverno e que sinaliza o dia mais curto e a noite mais longa do ano no hemisfério Norte. É o dia mais escuro do ciclo anual. No entanto, é tempo de um renovado começo: o renascimento da luz solar que voltará a vencer novamente a sombra. Vivenciamos, uma vez mais, nós, humanos argonautas desta nave planetária que é a Terra, um dos dois extremos da dança cósmica entre a luz e a sombra, extremos entre os quais, forçosa e inevitavelmente, balanceamos como um pêndulo no espaço-tempo, num eterno fluxo e refluxo, onde uma parte compensa na perfeição a outra, onde não há escolhas pessoais nem livre arbítrios, apenas aceitação total, de preferência, em compreensão e união amorosa, pelo que cada Ser deverá aceitar de forma semelhante tanto um radiante e caloroso Verão como um rigoroso e gélido Inverno, ou seja, em Amor. No Solstício de Inverno, a paragem aparente do Sol (sol sistere) parece prolongar-se por três dias na constelação do Cruzeiro do Sul (crux[1]), antes de reiniciar a sua jornada para norte em direção ao equador. Trata-se do renascimento da Luz ou, por outras palavras, do Cristo em nós. Daí a liturgia católica colocar a natividade de Cristo no dia 25 de Dezembro, cerca de três dias após o Solstício de Inverno, após o Sol ter estado “crucificado” na Cruz, de onde surge uma nova esperança, a esperança da luz renascer e vencer de novo as trevas na eterna espiral evolutiva, onde nos é dada mais uma oportunidade de expansão da consciência. Será esta a maior crença deixada pelo Fogo Interior de Sagitário, a de que a Centelha Divina está bem no fundo do nosso interior e que, mesmo em tempos de maior escuridão, ela poderá renascer a qualquer momento e expandir-se no eterno espaço-tempo. É esse o cálice sagrado, o Nós em toda a parte e o todo dentro de Nós.

Após esse acreditar no Fogo Interior, surge a ambição Capricorniana de conseguir ultrapassar todas as dificuldades do rigoroso Inverno que se inicia e que importa ultrapassar a fim de concluir a viagem. É uma etapa exigente e rigorosa, pois há que subir as escarpas da íngreme montanha até ao seu topo, lugar de onde se avistam ainda mais montanhas, mas também de onde se avista todo o vasto universo para lá de todas as nossas crenças pessoais que nos trouxeram aqui, vastíssimo universo no qual habitamos, tão longe e tão perto e que apenas e simplesmente nos levará, uma vez mais, ao eterno retorno primaveril. É assim um tempo de interiorização, mas também de sabedoria, resultado da velhice do tempo já percorrido e dos seus frutos já sazonados, tempo de sínteses e preparação da semente para os ciclos seguintes. Nesta última etapa do caminho zodiacal, toda a Natureza hiberna e um clima de austeridade espalha-se por todo o lado. A seriedade e a noção de limites são essenciais para enfrentar estes tempos difíceis.
Apesar da efeméride solsticial ter potenciado um novo crescimento da luz exterior, este tempo de Capricórnio é, supostamente, o período do ano mais difícil de suportar, o mais frio e rigoroso, onde, hibernada, toda a natureza parece cumprir o seu trabalho em segredo, de forma distante, reservada e silenciosa, imagem bem representativa do carácter mais frio e reservado destes nativos. Tudo se opera no tempo interior da dura cápsula da semente, síntese da abundância anterior e potencial da abundância seguinte. No rigor deste Inverno sombrio, há que ser prático, responsável, prudente e rigoroso na gestão dos escassos recursos existentes, pois ainda faltam três meses antes do acordar do novo ciclo. Embora vivendo atualmente em tempos diferentes, nesta altura do ano os nossos memes carregam todas estas memórias ancestrais, de muitos e muitos ciclos anteriores. Este é o momento de tomarmos consciência e noção de nossos limites, responsabilidades e deveres. Tal como os animais procuram proteção dos elementos da natureza, o Homem, instintivamente, constrói um muro de proteção em redor dos seus sentimentos de vulnerabilidade para com o ambiente invernoso. Como signo de Terra Cardinal, a aptidão Capricorniana vira-se para dar impulso a atividades práticas, concretas e duradouras no tempo. Caso se atreva, Capricórnio realizará, pragmaticamente, muitos dos sonhos, crenças e utopias sagitarianas, assumindo serenamente as suas responsabilidades pessoais, e mais ainda, as sociais, onde a sua procura de segurança é alcançada e preenchida.

À medida que a ilusão do tempo avança para Aquário, as regiões temperadas do hemisfério boreal atravessam pelo período de frio mais sólido e consistente, mas não o mais triste, pois a luz cresce a cada dia que passa e vai semeando um novo alento via ao ciclo seguinte. Nos dias mais bonitos e luminosos deste crescente de luz solar, procura-se a diversão fora de casa como uma forma de ocupação coletiva para vencer o frio, onde a solidariedade e fraternidade se espalha pelos poucos, mas bonitos, únicos e singulares dias deste período. Apesar do frio, esses soalheiros dias, agora maiores, darão início aos primeiros degelos do Inverno, trazendo cristalinas e renovadas águas a todas as fontes e ribeiros que descem das serras mais altas e repõem caudais por todo o lado. Assim é a energia de Aquário, signo representado por um homem sábio e de madura idade que transporta uma ânfora e deita o seu conteúdo líquido sobre o solo, espalhando conhecimento além-fronteiras e beneficiando todos os seus irmãos de jornada, todos indiscriminadamente, quer acolham ou não acolham essas águas psíquicas e diluvianas do conhecimento universal[2], ou seja, espalhando o Néctar dos Deuses. Com a Natureza hibernada e muito pouco para fazer lá fora, é tempo para pensar e refletir sobre todas as aprendizagens do ciclo que termina, reinventando e inovando processos para sua aplicação a ciclos futuros. Apesar da energia mental eletrizante e da frescura de ideias fértil a esses futuros ciclos, a frieza ainda abunda, manifestando-se rápida e intuitivamente, mas pouco calorosa e afetuosa, fraterna, mas indiferente e pouco emocional. Neste seu gosto em espalhar conhecimento, explicar a origem e o fim das coisas, o frio Ar Aquariano encontra o elixir da eterna juventude, pois aqueles que sabem muitas coisas não contam os anos que sobre si passam, interessando-se por uma ciência eterna e ganhando o hábito de pensar ao nível da humanidade, tal qual Ser vivo que não envelhece e que se encontra em eterno progresso.
Aproxima-se o fim do Inverno boreal e o final desta jornada cíclica finda com um Sol navegando por Peixes, dispersando a energia invernosa à medida que a luz do dia aumenta. A Natureza parece estar no limbo ao sair da hibernação e aprontar-se para uma nova atividade. É um tempo bastante mutável, ora são dias de inverno ora de primavera. Por um lado, os padrões do ciclo antigo já não encaixam, por outro, fica ainda difícil de definir quais serão os padrões emergentes. Há que se deixar inspirar pela imaginação e sonhar o novo ciclo que se abre, profetizar e ter fé num próximo ciclo de abundância e prosperidade. O degelo amplia-se com os raios de luz e calor cada vez mais fortes, fundindo as neves abundantemente em ribeiros, riachos, vales, rios e lagos, por todo o universo, fertilizando a terra e as sementes enterradas e prontas para morrer. Há que morrer para germinar, numa forte alusão à necessária morte e ressurreição do grão de trigo![3] Esta é a abundante Água de Peixes que se dispersa por toda a parte em direção ao grande oceano, às grandes águas, termo e origem de todos os ciclos... Assim o é também Peixes um signo de pré-criação, de vida uterina prévia ao recomeço, onde a morte é um nascimento e um nascimento um falecimento, um falecimento via à ressurreição por mais uma passagem pelo rio subterrâneo do esquecimento. Enquanto a memória de Caranguejo é clara, viva e memorável, a memória de Peixes é insondável, misteriosa, perdida na memória de universos dentro de universos. Na vibração de Peixes tudo é possível. É simbólico da união que confunde o céu e a terra, o criado e o não criado, o invisível e o visível, representando a dualidade de sentidos, de forças opostas de onde nasce toda a criação. Águas mutáveis com a tarefa de englobar e integrar todas as realizações e pontas soltas dos signos anteriores. Oposto ao signo da Virgem, é a compreensão dos conjuntos, das generalidades e negligência dos pormenores, o sentido do infinito, do ilimitado, do inumerável, do que não pode ser classificado, posto em listas ou catalogado. É aquilo que é inexprimível, imensurável, inexplicável. É a exclamação final do poeta, “Ah, não ser eu toda a gente e toda a parte![4] da sua Ode Triunfal. Para o nativo de Peixes não há outra nacionalidade que a de cidadão do mundo à espera de o ser do Universo.

Neste fim de ciclo, a compreensão do divino que nos religa, agora e sempre, aos ciclos da natureza, fica completa. Compreendemos e acreditamos (consciência da fé) na comunhão dos homens para com a totalidade da criação, ou seja, que Somos Todos Um. É esta a síntese de todo o processo Zodiacal! Perdoamos e esquecemos, relaxamos e sabemos que tudo aquilo que termina também recomeça, mas com a possibilidade de um renascer mais criativo e evoluído pela experiência assimilada e o amor incondicional a todo o processo.

Em Capricórnio geramos a ambição e o impulso para criar estruturas práticas, concretas e duradouras num tempo que sirva o coletivo, em Aquário espalhamos o Néctar dos Deuses por todos os irmãos de forma intuitiva e indiscriminada e em Peixes reconhecemos a Alma Universal[5] que verdadeiramente somos, onde Todos Somos Um, num encontro interno com essa alma gentil e gentia que une todos os opostos e contradições, culturas e religiões e que nos leva ao conhecimento e à prática espiritual sem mácula, onde cada um de nós se dilui no universo inteiro, ou como escrito nas belíssimas palavras do grande poeta,
“Sentir tudo de todas as maneiras,
Viver tudo de todos os lados,
Ser a mesma coisa de todos os modos possíveis ao mesmo tempo,
Realizar em si toda a humanidade de todos os momentos
Num só momento difuso, profuso, completo e longínquo.”
Passagem das Horas, Álvaro de Campos


Pela União das Almas, na Luz da Consciência[6]

14 de Dezembro de 2017





[1] Constelação localizada no céu meridional e uma das mais fáceis de reconhecer apesar de ser a menor das 88 constelações modernas. Seu nome significa Cruz em latim e é comumente conhecida como Cruzeiro do Sul. Muito conhecida na antiguidade e em particular pelos navegantes.
[2] Águas aéreas, perceptíveis à alma e não ao corpo.
[3] “Em verdade, em verdade vos digo; se o grão de trigo, caindo na terra, não morrer, fica ele só, mas se morrer, produz muito fruto”, João 12:24
[4] Frase final da Ode Triunfal de Álvaro de Campos.
[5] Ou Superalma Universal: todas as almas individuais unidas numa mesma alma.
[6] Citação de Maria Flávia de Monsaraz.

quarta-feira, 13 de setembro de 2017

OUTONO, O RETORNO AO EQUILÍBRIO

À medida que se aproxima o equinócio de Outono no próximo dia 22 de Setembro pelas 21h, fácil e gradualmente vamos sentindo um novo retorno ao equilíbrio entre a luz e a sombra. A Terra volta a alinhar-se num dos pontos definidos pela interseção entre o plano eclíptico, o plano equatorial terrestre e a esfera celeste, em mais um encontro de equilíbrio equinocial, na eterna dança cósmica por onde todos passeamos de forma mais consciente ou inconsciente. Com este retorno ao signo da Balança, o ciclo anual de crescimento e abundância, iniciado na Primavera última e culminado no Verão que termina, dá lugar a um abrandamento e acalmia das forças da natureza. Tudo o que anteriormente cresceu para a luz dominante, começa a minguar e a morrer, no seu lado mais exterior, à medida que a sombra retoma a sua posição de predomínio. É neste período de primazia da sombra face à luz que se inicia o ciclo da semente interior, o preparar do gérmen, da forma, da vida e do amor do ciclo de renascimento primaveril seguinte, se vier, quando vier...

Os excessos do Verão, esse apogeu luminoso do impulso primaveril, chega ao fim. A Terra evidencia o seu cansaço e precisa de hibernar. Tudo se direciona para um novo equilíbrio dos elementos. Para muitos dos habitantes no hemisfério norte, é tempo de regressar à rotina e acalmia. Acabam-se assim os longos, festivos e radiantes dias de calor e abundância estival que muito nos alegraram, mas que também muito nos esgotaram, e tal terra seca, estéril e sedenta de água das temperaturas quentes e secas dos últimos dias de Verão e das últimas colheitas do ano, apresenta-se pronta para se casar com as primeiras chuvas de Outono, águas que lhe trarão uma nova vida e uma fertilidade futura, assim os homens também precisam de humedecer e arrefecer um pouco os seus comportamentos e retornar ao equilíbrio, de forma pacífica, em alegria e aceitação.

À medida que a temperatura desce e o brilho do Sol diminui, é tempo de desacelerar, repousar, sossegar e acalmar um pouco da azáfama das “colheitas” de Verão. O nativo de Balança, reflete um pouco deste tempo de acalmia, o de viver descontraído e sereno, desejando não encontrar controvérsias, conflitos ou desarmonias de qualquer espécie. Gosta de viver sem grandes excessos, complicações ou ostentações, de forma sorridente e simpática, ou seja, procurando sempre o equilíbrio das coisas, dos atos, dos gestos, das palavras... Isso não indica que sejam medianos em tudo, apenas procuram ser equilibrados e justos. A energia de Balança não gosta de extremos nem de magoar os outros. De natureza mais húmida que quente, a sua sentimentalidade anima tudo o que toca pelo seu calor comunicativo e tempera tudo com os matizes do seu estado de alma. Assim deverá ser o arranque Outonal equilibrado em todos nós. Ao contrário do impulso independente de Carneiro para agir, fazer acontecer e abrir caminho,
os tempos de Balança são o regresso ao equilíbrio feito através da cooperação, parceria, sinergia, união amorosa e pacifismo, que nos irá “aquecer” e ajudar a passar os próximos meses de frio e primazia da sombra. Harmonicamente juntos, será mais fácil!

Desta forma, após meio ano ou meia roda Zodiacal de crescimento para fora, de crescimento, amadurecimento e aperfeiçoamento individual, é tempo de sair de si e espelhar-se no casamento com o “outro”, a etapa seguinte via ao infinito, à via universal. Nos próximos meses, as agitações exteriores cederão o seu passo à vida interior, à meditação e ao despertar da espiritualidade, alcançada e vivenciada por fim pela compaixão universal do último capítulo Zodiacal, sob a égide de Peixes. Em muitas culturas dos trópicos, a queda da temperatura, o amarelar e o início da queda das folhas das árvores, precipitava o frequente culto de celebração do início da passagem da natureza aos infernos, à sua aparente morte, como era exemplo disso o culto a Adónis na Grécia antiga, entre muitos outros. Passagem aos infernos refletida em grande medida pelo signo de Escorpião, signo alquímico de grande poder e transformação pessoal, a designada porta oculta de Escorpião. E é nessa porta que, com o minguar cada vez maior da luz, a vegetação vai morrendo, o frio espreita, a sombra vence e tudo o que se opõe à vida luxuriante da Terra fértil e prometida de Touro impõe-se e morre nas águas presas e profundas de Escorpião. É neste período de Escorpião que ainda hoje se celebra o dia de Todos os Santos e o dia dos Mortos, reflexo arcaico de ser neste período que no trópico boreal se observa com maior intensidade a morte e transformação da Natureza. A energia de Escorpião reflete todo este processo de morte e transformação, processo que acarreta sempre alguma violência, complexidade e alquimia. Ao contrário da constância da forma e abundância da vida em Touro, Escorpião rege os últimos dias desse ciclo luxuriante, a morte e o desfazer dessas formas vividas, muitas vezes manifestado através de um ego levado ao extremo da cegueira e obsessão, antes de, obrigatória e compulsivamente, se dissolver na consciência e desígnios coletivos dos quatro signos subsequentes. São tempos de sentimentos fortes e profundos, pela inevitabilidade da morte das formas e forçada aceitação do desapego às mesmas. Escorpião associa-se a todos os processos sentimentais e psicológicos da vida mais profundos, aos mistérios da morte, do renascimento e das relações interpessoais mais passionais.

Ao chegarmos a Sagitário, a natureza encontra-se despida da sua luxuriante camada exterior de vida e beleza. O cair da noite precipita-se de dia para dia, parecendo que a sombra irá vencer a luz para sempre e tudo na Terra irá morrer na escuridão do tempo. Nesses pequenos dias pouco há a fazer no exterior, indicando-nos que, despidos das nossas vestes e de muitas outras quinquilharias mais ou menos reluzentes à luz exterior, o próximo caminho a fazer será para dentro de nós mesmos, de fora para dentro, numa celebração da vida interior que habita em nós, em busca do espírito que nos sopra e anima a cada segundo, esse templo eterno e omnipresente, o reconhecimento da centelha divida em cada um de nós. É tempo de viajarmos e de nos aventurarmos na demanda do cálice sagrado e ver mais além, ao mesmo tempo que

erguemos a cabeça para o céu noturno em busca de sentido para tamanha grandeza e vasto horizonte. Na primazia da luz tudo cresce para fora. Na primazia da sombra o crescimento direciona-se para o centro de nós mesmos, da nossa essência, na procura da sábia luz interior. Desta forma, Sagitário representa a época do ano em que os dias diminuem de tal forma que a única via é voltarmo-nos para o fogo interior, para a compreensão do espírito humano e da fé indivisível que transcende o ego, esse sujeito dividido. O verdadeiro sentido da vida ou Pedra Filosofal encontra-se no nosso centro, no nosso interior, no nosso coração, esse sopro divino1 que navega sobre as águas. Essa é a sabedoria eterna, que comanda as rédeas de uma mente perspicaz e ao seu serviço. Nesse Fogo interior podemos encontrar a aspiração mais humana e divina do ser, o seu pensamento mais puro, elevado e atuante, que nos faz acreditar e seguir a flecha da verdade. Após o desapego e a morte do ego2 individual de Escorpião há que unir forças para um objetivo mais elevado e transcendente, transpessoal e coletivo. Quanto mais perto do solstício de Inverno menor a luz exterior e maior deverá ser a luz interior a habitar cada um de nós e que nos deverá guiar nos ciclos vindouros, trabalho anual a fazer a cada retorno a Sagitário, a cada retorno ao solstício de Inverno3, tempo de crescimento e expansão interior.
Desta forma, em balança aceitamos pacifica e cordialmente o outro lado da Luz na verdade da partilha amorosa equilibrada e do seu inevitável reflexo de nós mesmos, em Escorpião desapegamo-nos do amor e desejo pessoal de todas as formas vividas, conquistadas e amadas, aceitando, muitas vezes dolorosamente, a alquimia da transformação pessoal, e em Sagitário viramo-nos para a Luz interior, proclamando e disseminando a sua verdade por todos os continentes. Todos os três signos, contemplam e matizam a energia do adulto maduro, aquele que alcança e se compromete em parcerias positivas e ganhadoras, refletoras de si mesmo, que abdica dos seus próprios desejos, manias, apegos e poderes pessoais de modo a poder entrar no túnel de luz que nos leva à essência e nos traz um sentido maior e mais amplo à Vida.

Por fim, aproxima-se o Inverno, o fim do ciclo boreal, onde podemos encontrar a liberdade da nossa individualidade no todo a que pertencemos, pelo trabalho conjunto e coletivo e pelo compaixão e universalidade por todos e pelo todo que nos habita. Mas antes de nos pormos a caminho de mais uma passagem pelo rio subterrâneo do esquecimento, após encontrar o cálice sagrado de Sagitário, há ainda que subir as escarpas da íngreme montanha, carpir o tempo e descer nas águas diluvianas do conhecimento universal e amor incondicional.


1 Ou Espírito Santo.
2 Morte simbólica do ego: a sua domesticação e resignação ao poder compulsivo que empreende, deixando de estar no comando e controlo das decisões e passando a iniciado, ou seja, passar a estar ao serviço do bem comum.
3 A natividade de Cristo – leia-se luz interior ou Ser interior Iluminado – colocada arbitrariamente três dias após o solstício de Inverno não é uma coincidência, nem uma ideia ou criação original cristã-católica, é simplesmente uma adaptação litúrgica, baseada no conhecimento das grandes tradições esotéricas há muito conhecidas, ou seja, no “renascimento do Sol”. 

VERÃO, A RADIÂNCIA DE SER

Chega o verão e a menor noite do ano também. A eterna batalha entre a luz e a sombra retorna a um “novo” climax, a mais um retorno do Sol a um dos seus dois extremos de declinação: o solstício. Solstício, do latim Sol sistere, Sol que não se mexe, é o momento em que o Sol durante seu movimento aparente na esfera celeste atinge a maior declinação em latitude a partir da linha do equador, “parando” e seguidamente volvendo ao seu ponto de equilíbrio equinocial. Com a entrada da energia de Caranguejo no solstício de Verão, abre-se um novo ciclo de abundância em nosso redor. A natureza ocupa-se em cuidar e nutrir de toda a abundante e luxuriante vida que ela própria gerou no último impulso Primaveril. É fácil encontrar qualquer coisa comestível em qualquer prado ou cultivo. Nos campos e vales mais férteis, a união do calor com a ainda água restante do inverno faz tudo crescer até ao seu máximo. Tudo está em pleno crescimento, mas há que proteger os frutos ainda imaturos, dependentes e presos às plantas mãe, da imprevisibilidade e do “alheio”. Na evolução deste ciclo anual, existe ainda alguma vulnerabilidade e um forte receio de o fruto não vingar. Este é o reflexo das energias de Caranguejo, símbolo esquematicamente representado por dois elementos colocados frente a frente, representando um ovo de duplo germe, o grande ovo original ou Ouroborosi, símbolo da fecundidade e das origens e memórias ancestrais. O sentido profundo deste signo reporta-se a tudo o que está encerrado e que está prestes a sair. Neste sentido, representa o óvulo fecundado que dará mais tarde a semente e o seu germe. No Zodíaco é o primeiro signo de água, pois tudo o que está em gestação tem necessidade de água. Outrora, dizia-se que as almas vinham da Via Látea franqueando o portal do Caranguejo. Chamavam-se “abelhas” a essas almas que vinham encarnar sobre a Terra e “colmeia” ao centro da constelação de Caranguejo. Em hebreu a estrela mais brilhante desta constelação chama-se Acubene, que significa “recanto secreto”, tão característico da energia de Caranguejo.

Com o passar das semanas caminhamos em direção à plenitude do Verão, plenitude que nos espelha a energia de Leão, o coração do Homem, o entusiasmo, o entretenimento e a energia pura de criação. É tempo de alegrias, férias, brincadeira e diversão. Há luz e festas por todo o lado e os dias são quentes e grandes para podermos mostrar toda a nossa vontade, vitalidade, brilho e dignidade interiores. Os frutos amadurecem, exibem o seu brilho e poderão ser apreciados e escolhidos para colheita. É o auge do impulso Primaveril. É tempo de celebrar e mostrar o amor pela vida em todo o seu esplendor. A alegria e a luz transparecem na satisfação pela a vida e é tempo propício para festas ao pôr do Sol e para viver como reis, radiantes e generosos. Existe a certeza de podermos ser o que de melhor existe em cada um de nós. Sentir-se único e especial, confiar na própria capacidade, criar e buscar prazer é um excelente mote para este radiante período. Leão é regido pelo Sol, o Astro Rei. O Sol é o Homem que domina o seu destino, o herói, o Homem que triunfou sem ajuda e sem cometer maldade, a vontade de simplesmente Ser.

À medida que a luz retorna ao seu ponto de equilíbrio com a sombra, o Sol atravessa o tempo do signo da Virgem,
o calor dissipa-se e o verão passa a ser mais discreto do que até então. No campo, corresponde ao árduo período de colheitas e de saber concretamente se foi ou não foi um ano farto, produtivo, eficiente. É tempo de terminar as colheitas e separar o “trigo do joio” através de uma mente crítica, meticulosa e racional, que tinha como propósito armazenar da melhor forma a colheita anual que serviria todo o período de paragem produtiva seguinte. Virgem, a rapariga ou a casa do pão, analisa se os próximos tempos de decadência e “descida aos infernos” serão de fartura ou de carência, de saúde e bem-estar ou precariedade e doença. É tempo de reequilibrar as energias para esse novo ponto de transição, o equinócio de Outono, e preparar a passagem do inverno.

Este ano o Solstício de Verão ocorreu no dia 21 de Junho de madrugada. Este instante marcou o início do Verão no Hemisfério Norte, a estação mais quente do ano, que se prolongará por 93,65 dias até ao próximo Equinócio a ocorrer no próximo dia 22 de Setembro pelas 21h02min. Durante este período todo o ser em nós tende a exteriorizar-se, a vir para fora, a entusiasmar-se numa onda constante e numa vigorosa energia de criação.
Tempo de Sol, de calor e amor próprio, de vontade indómita de expressarmos o que temos de mais radiante em nós. A sombra é curta e a luz domina. Apetece brincar, festejar e divertir-nos. Após os primeiros anos de criança e primeira juventude, simbolizados pelos três primeiros signos, a maioridade instala-se e a identidade individual consolida-se e manifesta-se em toda a sua exuberância e radiância, vaidade e esplendor. É um tempo de crescimento e expansão, vigor e alegria, onde o propósito inicial, esse eterno retorno primaveril, manifesta intensamente o seu lado mais exterior e autocentrado. Em Caranguejo apercebemo-nos de onde vimos e como amamos o nosso céu ancestral. Em Leão manifestamos todo o esplendor dessa semente que personificamos de forma única, autêntica e brilhante. Em Virgem aperfeiçoamos a individualidade do nosso Ser. Todos os três signos, contemplam e matizam a energia do jovem adulto, o conforto e protecionismo de pertencer a uma família, a um clã, a exuberância e radiância de Ser genuíno e autêntico e a necessidade de me aprumar e adaptar-me a um mundo profissional na via da autossustentabilidade. Tudo isto antes de mergulhar na verdade da partilha e do espelho advindo e adquirido no inevitável confronto de uma relação amorosa, energia matizada pelos signos da Balança e Escorpião. 

segunda-feira, 3 de abril de 2017

PRIMAVERA, ESSE ETERNO RETORNO

Por vezes é uso perguntarmos quantas primaveras já viveste, ao invés de perguntarmos a idade a uma pessoa, particularmente para perguntar ou indicar a idade de pessoas jovens. Primavera associa-se ao ser jovem, aos inícios, aos primeiros anos, onde a cada Primavera surge um novo impulso de consciência, renovação e crescimento. Se alguém te perguntar o número de Primaveras que tens, procura simplesmente indagar quantos retornos já viveste, quantos retornos já fizeste em teu redor, em redor do teu centro, do teu Sol. Quantas voltas já deste à tua própria luz? Quantos retornos já fizeste a ti mesmo? A vida na Terra é uma viagem de retornos em volta da luz solar, de ciclos e marés, uma espiral evolutiva de ilusão em ilusão, de retorno em retorno, fomentada pelo eterno jogo entre a Luz e a Sombra. O equinócio boreal de Março no hemisfério norte é um dos dois pontos vernais desta eterna roda viva, um dos dois pequenos e breves momentos de equilíbrio entre Luz e Sombra. Dois breves momentos numa dinâmica cíclica e contínua anual. Este equinócio boreal representa, no nosso hemisfério norte, o ponto de retorno a um novo reflorescimento da flora terrestre (da mãe Terra) e com ela um novo reinício do ciclo da fauna terrestre, assim como, de hábitos, afazeres e saberes culturais (e, por conseguinte, de Consciência) humanos. O ciclo anual a que assistimos, mais ou menos consciente, todos os anos, é um perfeito jogo de equilíbrio homeostático entre Luz e Sombra, tantas vezes representado em mitos e lendas, tais como os mitos gregos de Perséfone ou Adónis. Morte e renascimento não são apenas ciclos de uma vida, mas sim de todos os anos. Na próxima Primavera (exterior ou interior) seremos os mesmos, mas renascidos em maior magnitude em algum ponto de Luz, num aspeto, num traço de personalidade, numa ideia, numa ocupação, num sentimento. Ou em vários, grandes ou pequenos, mais visíveis ou mais discretos, mas que serão pequenos pontos de Luz renascidos, reanimados do domínio penumbral, transformados por ela e retornados ao domínio da Luz. Importa referir que Luz e Sombra são faces da mesma moeda. Não existe sombra, apenas ausência de Luz. O que importa compreender é a dinâmica inerente a este eterno jogo, compreender e aceitar este eterno retorno.
Após bem compreendida a dinâmica solar e o eterno retorno ao ponto de equilíbrio e de renascimento, quer dos seus efeitos casuísticos e visíveis, quer das respetivas interpretações ou significados intrínsecos e invisíveis, há que virar esse entendimento e compreensão para o eterno retorno solar interior, da consciência individual de cada um em movimento, em eterna expansão, internalizar a Luz e expandir a consciência, compreendendo que ela própria tens pontos de equilíbrio e de eternos retornos… Para mim, compreender é sinónimo de amar (aceitar em amor) e compreendendo o eterno retorno solar exterior e interior prover-nos-á de amar a vida na sua plenitude e respeito, amar os nossos corpos, os nossos sentimentos, todas as nossas circunstâncias, lugares, horizontes... e dos outros também, pacificamente, quer faça chuva ou faça sol! Podemos observar que uns chegarão rápido à compreensão externa do ciclo da luz, outros demorarão a contemplar essa magia do eterno retorno. Uns almejam compreender o seu retorno interior, outros há que ma sua perfeita cegueira nem se apercebem da sua “existência”. No entanto, cada um no seu ritmo, ao seu passo, sem julgamentos, sem discriminações, pois apenas a cada um caberá escolher o “tempo” ideal de iniciação para entender os mistérios da luz.
Quantas primaveras vivemos numa encarnação? Quantas vezes retornamos ao mesmo ponto de retorno? Neste perfeito sistema aberto não existem respostas fechadas e por isso tudo será relativo, tudo ficará em aberto e dependente do nosso encaixe nessa constante dinâmica homeostática. Há Primaveras todos os anos. Sim, a cosmologia onde encarnámos propõe-nos um renascimento todos os anos, para que não esqueçamos que essa é a Lei, que o eterno retorno é absoluto e constante. Mas outros ciclos, mais ou menos subtis, existem. Outros ciclos, dentro de ciclos. Através do horóscopo individual poderemos facilmente observar vários outros renascimentos ou Primaveras de duração diferente do ciclo anual, de dois em dois anos, de doze em doze, de trinta em trinta, ou mais largos no tempo, vividos à medida que nos afastarmos do nosso centro cósmico individual e partimos em busca duma (ou nos expandimos numa) consciência coletiva e plural, onde e sempre, a essa distância, voltaremos a ser Unos novamente.
Podemos observar vários pontos de retorno num qualquer horóscopo individual, várias Primaveras, como, por exemplo, o retorno solar. Mas existe um ponto vernal pessoal por excelência que nos é indicado pelo grau do nosso ascendente no preciso momento em que demos entrada nesta dimensão terrena. É o ponto que marca a Primavera de cada planeta que a ele retorne. É a Casa da Partida onde recebemos, não uns euros, mas uma boa dose de iniciativa, energia renovada, coragem, vitalidade e entusiasmo para mais um ciclo de dinamismo e aprendizagem, para mais uma volta ao estádio, para mais um passo na evolução da consciência, para mais um renascimento, para mais uma temporada de consciência. Este ponto vernal é matizado pela energia do signo que ascendeu para a Luz a leste do nosso horizonte no preciso momento do nosso nascimento. Daí a sua importância, a de retornarmos com frequência e eternamente, nesta encarnação, a esse ponto de equilíbrio, de renovação e impulso. Este signo, compreendido e aceite, ajuda-nos e impulsiona-nos a subir na espiral da vida e expansão da consciência. É uma escolha acordada. Este ponto individual marca profunda e aparentemente (também nos está no rosto) todo o renascimento da nossa passagem terrena. No espaço intemporal, no não espaço e não tempo, noutras dimensões, tudo será eternamente diferente.
Primavera, Verdade Primeira, é sinónimo de juventude e das primeiras experiências, experiências verdadeiras pela simplicidade e espontaneidade constantes. Todos os seus três signos, Carneiro, Touro e Gémeos, contemplam e matizam essa energia de juventude, do entusiasmo, beleza e frivolidade dos primeiros anos de vida, do princípio de querer ser, ter e comunicar. Uma idade prévia à memória de pertencer a algo, a um berço, a um passado, memória matizada pelo signo de Caranguejo.

Bem-haja a todos, deixando-vos nas sábias palavras de Maria Flávia de Monsaraz,

“Pela União das Almas, na Luz da Consciência”.

João Aivão, Março de 2017